Teoria do Mito dos Povos Originários
(Teoria da Etnogênese Conflitiva: Migração, Territorialidade e a Ilusão dos Povos Originários)
Autor: Flávio [Sobrenome]
Afiliação: Pesquisador independente
Ano: 2025
Resumo
Este artigo propõe a Teoria da Etnogênese Conflitiva, que defende que a história humana é marcada por migrações constantes, processos de reinvenção cultural e predisposições evolutivas para conflito territorial. A noção de povos originários fixos é, portanto, uma construção política e cultural, e não uma realidade histórica. A fundamentação da teoria se apoia em Thomas Hobbes (a guerra como estado natural), Eugene Kulischer (a migração como constante universal), Yuval Noah Harari (a crítica à pureza identitária), Eric Hobsbawm (a invenção das tradições), na psicologia evolutiva (predisposições à agressão territorial) e em Wrangham, Johnson & Toft (guerra como fenômeno planejado, não apenas instintivo). Conclui-se que todas as identidades humanas são produtos de misturas sucessivas, invasões e reinvenções, desmontando a ideia de identidades imutáveis ou puras.
Palavras-chave: etnogênese; povos originários; territorialidade; migração; guerra; identidade.
Introdução
A discussão sobre povos originários e identidade cultural tem ganhado relevância em debates políticos e sociais contemporâneos. Entretanto, a noção de que existiriam povos fixos, imutáveis e originários em determinado território há milênios é problemática quando confrontada com a história da humanidade. A presente proposta, denominada Teoria do Mito dos Povos Originários, ou de forma mais acadêmica Teoria da Etnogênese Conflitiva, sustenta que a história humana é marcada por deslocamentos populacionais, disputas territoriais e reinvenções identitárias.
Fundamentação Teórica
Thomas Hobbes – Guerra como estado natural
Em Leviatã (1651), Hobbes descreve o estado de natureza como uma “guerra de todos contra todos”, em que os indivíduos invadem por ganho, segurança e reputação. Isso demonstra que o impulso de conquista e defesa territorial é parte da condição natural da humanidade.
Eugene M. Kulischer – Migração como constante
Kulischer (1948) defende que a migração é perpétua, parcial e universal. A aparente imobilidade dos povos é uma ilusão: sempre há deslocamentos em andamento. Quando territórios estão ocupados, tais movimentos resultam em conflitos e invasões.
Yuval Noah Harari – O mito das identidades puras
Harari (2014) argumenta que culturas e sociedades são produtos de misturas sucessivas. A ideia de povos originários fixos corresponde mais a um mito político do que a uma realidade histórica.
Eric Hobsbawm – Tradições inventadas
Hobsbawm e Ranger (1983) demonstram que muitas tradições e identidades “ancestrais” foram inventadas para legitimar poderes políticos. Isso reforça que a “pureza originária” é uma construção social.
Psicologia evolutiva – Agressão territorial como predisposição
Pesquisas em psicologia evolutiva (BUSS; SHACKELFORD, 1997; MCDONALD; NAVARRETE; VAN VUGT, 2012) sustentam que humanos desenvolveram predisposições para formar coalizões de guerra, atacar rivais e defender território — comportamento comparável a outras espécies animais.
Wrangham; Johnson & Toft – Guerra planejada
Wrangham (2018) distingue agressão reativa (impulsiva) da agressão proativa (planejada), afirmando que a guerra humana é predominantemente estratégica. Johnson e Toft (2013) reforçam que disputas territoriais são os conflitos mais persistentes e violentos da história.
Discussão
A Teoria do Mito dos Povos Originários argumenta que a humanidade nunca foi estática: povos migram, ocupam, misturam-se e reconstroem identidades. Hobbes oferece a base filosófica para entender a guerra como estado natural; Kulischer fornece o respaldo histórico-demográfico da migração; Harari e Hobsbawm desconstroem os mitos de identidade fixa; e a psicologia evolutiva, junto a Wrangham e Johnson & Toft, demonstra que a agressão territorial possui raízes evolutivas e estratégicas.
Assim, conflitos por território e episódios de extermínio não são aberrações, mas parte de uma estrutura recorrente da história humana. Identidades culturais são produtos dinâmicos de mistura, conflito e reinvenção.
Conclusão
A história humana é inseparável de processos de migração e conflito territorial. A ideia de povos originários fixos é, portanto, uma ficção cultural e política, sustentada por mitos e tradições inventadas. A Teoria da Etnogênese Conflitiva afirma que todas as identidades humanas resultam de etnogênese sucessiva, sendo moldadas por guerras, invasões e adaptações. Reconhecer esse padrão histórico é essencial para superar visões essencialistas e compreender a humanidade como um processo em constante transformação.
Referências (ABNT)
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BUSS, David M.; SHACKELFORD, Todd K. Human aggression in evolutionary perspective. Clinical Psychology Review, v. 17, n. 6, p. 605–619, 1997.
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HARARI, Yuval Noah. Sapiens: Uma breve história da humanidade. São Paulo: Companhia das Letras, 2014.
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HOBBES, Thomas. Leviatã, ou a Matéria, Forma e Poder de um Estado Eclesiástico e Civil. São Paulo: Martin Claret, 2003.
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HOBSBAWM, Eric; RANGER, Terence. The Invention of Tradition. Cambridge: Cambridge University Press, 1983.
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JOHNSON, Dominic D. P.; TOFT, Monica Duffy. Grounds for War: The Evolutionary Biology of Territorial Conflict. International Security, v. 38, n. 3, p. 7–38, 2013.
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KULISCHER, Eugene M. Europe on the Move: War and Population Changes, 1917–1947. New York: Columbia University Press, 1948.
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MCDONALD, Melissa M.; NAVARRETE, Carlos David; VAN VUGT, Mark. Evolution and the psychology of intergroup conflict: The male warrior hypothesis. Philosophical Transactions of the Royal Society B, v. 367, p. 670–679, 2012.
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WRANGHAM, Richard W. Two types of aggression in human evolution. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 115, n. 2, p. 245–253, 2018.
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